sábado, 7 de abril de 2012

tu e a tua bicicleta (SEXTA-FEIRA SANTA 2012)



sem ninguém que te distraia,
sem compromissos nem desculpas.
sem pressões nem competições,
só tu, contigo mesmo, e
uma vontade inexorável de te fazeres à estrada,
de perpetuares o movimento do pedaleiro até esgotares a necessidade de pedalar



5 horas,
6 subidas,
nevoeiro, sol, chuva, granizo, frio (muito frio a descer)
3200 m de acumulado
86 km
4600 Kcal

e uma promessa...
- "provavelmente" nunca mais

Em primeiro a estranha relação com as Sextas-feiras Santas.
Desde há três anos que começou uma bizarra relação amor-ódio com este dia.
Eu ponho-me à prova e a natureza brinda-me sempre com situações climáticas agrestes.
Neste ano comecei a subir com um sol radiante, a meio já vou envolto em nevoeiro denso e depois mais sol.
Até ao final veio o frio, a chuva, o granizo, o calor intenso, o céu coberto de nuvens a ameaçar desabar em cima de mim e a permanente ameaça de que nada estava garantido.

Arranquei e 10 metros depois já estava a subir. Ritmo de aquecimento.
A sensação de um dia para se ir levando com calma aflorou-me à ideia.
Durou quase até ao cimo da Serra de Montejunto até ao momento em que verifiquei que tinha um furo e a câmara-de-ar suplente no carro. Forcei o final e consegui não parar.
A ideia de deixar a vertente de Vila Verde para o inicio e final ficou comprometida.
Descer custou muito. Paragens para bombear algum ar para a roda traseira e depois ir descendo com muito cuidado.
De regresso ao assunto do dia, novamente a aquecer mas mais solto que na primeira incursão.
Preocupações com as condições meteorológicas, absolutamente instáveis e com variações bruscas.
A segunda subida foi a "mais fácil".
Depois veio a primeira vertente pela Abrigada.
A primeira parte é dura. Depois da descida gelada começar logo com uma rampa com passagens a 18% causa algum transtorno. Consegui entrar bem e só na curva fechada é que senti necessidade de forçar em pé.
Geri bem a comida e não tive quebras acentuadas de níveis de açucares.
O tempo nesta vertente faz justiça ao nome da localidade que a define e o calor fazia-se sentir.
Até ao final ritmo constante e a constatação da dureza da segunda parte (após o cruzamento de Pragança)

Metade da jornada estava concluída.

A quarta subida, novamente pela Abrigada para encerrar o respectivo capítulo, foi dura.
Para ajudar à festa na parte final fui bombardeado por granizo e dei comigo a pensar seriamente no assunto que ali me levou.
Para não comprometer decidi adiar alguns raciocínios para a quinta subida (vertente Pragança) e confirmei que afinal facilmente me consigo meter em exercícios de masoquismo que nem a ingestão de um gel energético de absorção rápida consegue aliviar.
Ocultei a informação no visor do GPS e fui tentando não pensar. O pulso cada vez custava mais a subir (cansaço acumulado) e inclinações de 13% dão-me algum azar...
O final foi esgotante. Na descida, a seguir à fábrica do gelo olho para a esquerda mas o cérebro envia-me para a direita, novamente até Pragança.

A sexta foi feita por intuição e parecia um exercício de auto-flagelação. Olhos baixos e depois de esgotar a capacidade de pedalar em pé deitei-me, literalmente, em cima da bicicleta e ia pedalando dentro do possível em cadências de 40 rpm.
Desapareceu o frio o calor a fome, tudo!
Parecia um autómato sempre no mesmo registo. Assim que cheguei ao miradouro, já com a parte final à vista, tive de parar para não me urinar pelas pernas abaixo.
Penso que nunca tive um sensação de cansaço como a que senti nesse momento. Tremia e não sabia se era do frio ou da fraqueza. O corpo "morria-me" e sentia os olhos a mergulharem-me no rosto salgado.
Finalmente fez-se-me luz!
- Vou já para o carro e não vou fazer a parte final.
Até Vila Verde o frio invadiu-me e os pés encharcados deixaram de se fazer sentir.
Troquei de roupa no carro e forcei-me a ingerir alguma bebida. Até Mafra tive sensações corporais estranhas e por sorte não tive uma saída de estrada porque ia adormecendo ao volante.
Só pensava:
- Ainda bem que não me lembrei de ir à sétima...

5 comentários:

  1. Não precisavas de fazer isto, já sabia que eras meio "doido". Irraaaa... Minha bela garagem, lol
    Parabéns pelo esforço!

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    1. Obrigado

      Da próxima vez emprestas-me esses rolos XPTO programáveis e pelo menos a parte do mau tempo sempre se evita!

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  2. Acabei agora mesmo de ver na SIC a Alice no País das Maravilhas,e tenho certeza de uma coisa:
    Manso dás um bailinho ao Chapeleiro Louco.
    Parabens pela teimosia e capacidade de sofrimento.Admiro-te.Abraço

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  3. Não sei quem é a personagem mas com um nome desses já tem a minha simpatia!

    Obrigado

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  4. Gosto bastante da tua crónica,ao le-la transporta-nos um pouco para a tua "loucura"e em particular ao q passamos em cima das bicicletas,agora chegares ao ponto de adormeceres ao volante devido ao exagero,ai dá-me vontade de te mandar para aquele sitio e dizer-te daaaaaaaaaaaaaa estás mesmo louco homem.
    Abraço

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